sexta-feira, 30 de setembro de 2011

das leituras atuais

Tenho lido pouco. Falta de tempo, de concentração, cansaço ao fim do dia, turbulências afetivas, luz fraca, livros encaixotados, etc. Me arrastava na biografia de Fernando Pessoa (José Paulo Cavalcanti Filho) e no Junta-Cadáveres (Juan Carlos Onetti). Quando encontrei, na prateleira das liquidações, o Fim do Mundo (Otto Friederich). E, dos poucos livros que deixei fora das caixas, uma coletânea de contos de Caio Fernando Abreu, selecionados por Luciano Alabarse.

1. A biografia de Fernando Pessoa é minuciosa. O biógrafo vasculhou a vida do poeta ao avesso. Até subiu até na janela de um dos apartamentos (?) onde FP provavelmente morou, em Lisboa, só para ouvir um certo badalar de sinos, mencionado em um verso de Alberto Caeiro. Emperrei na descrição da infinidade dos heterônimos (pra lá de 120). Matemática estranha. O autor relaciona tudo: nomes escritos em notas de pé de página de manuscritos, em papéis de embrulho, em cartas para parentes, até espíritos que teriam encarnado em FP. É chato. Leitor cartesiano, não consegui pular essa parte. Aos trancos e barrancos cheguei à letra "M". Contando as páginas para chegar ao próximo capítulo, onde se descreve a relação do poeta com o Brasil.

2. O Junta-Cadáveres apareceu por acaso. Alguém tinha me sugerido a leitura. Comprei. Apesar de, logo no primeiro parágrafo do prefácio, ser dito que Onetti "não se agrupou em torno de uma certa voga salpicada de localismo ideológico, temático, geográfico, ou seja lá de que procedência fosse", até onde consegui ler, é um típico romance latinoamericano. Com personagens reincidentes: putas velhas e desgrenhadas, gigolô desiludido, machistas, político, médico e advogado de província, etc. Apesar disso, Onetti permite-se descambar para o puro lirismo, como a citação do post de outro dia. É linda a imagem da chuva caindo incessante durante todo o romance.

3. Caio Fernando Abreu é daqueles que não canso de ler. Gosto do tom aparentemente esculachado que ele escreve. Houve uma época (adolescência pretensiosa!) que eu não entendia a razão de Morangos Mofados (Limite Branco, Ovo Apunhalado) terem feito tanto sucesso. Achava os textos mal escritos, melosos, mal-inspirados em Clarice. A paixão veio com a maturidade. Mais especificamente com o Triângulo das Águas. E os que vieram pós Aids. Paguei a língua. Confesso, batendo no peito: a) os meus contos melosos, mal-inspirados em CFA; b) até hoje ele me excita.

4. As imagens da capa e contracapa de O Fim do Mundo - uma bomba atômica explodindo; crianças africanas famintas; judeus em campo de concentração; soldados marchando - por si só justificariam o título. Logo no prólogo uma descrição maravilhosa de uma erupção vulcânica que destruiu a ilha de Santorino, no ano de 304 dC. Para o autor, o fim do mundo aconteceu em vários momentos históricos, menos ou mais intensos. Na verdade, o fim do mundo é o fim (trágico, catastrófico, destruidor) de uma etapa e as consequentes transformações (inclusive literárias) que dão início a uma nova etapa da História. O autor escolhe os mais pop: a invasão do Império Romano pelos bárbaros; a Inquisição e a peste na Idade Média; a Contrarreforma; o terremoto de Lisboa; a Revolução Russa; Auschwitz. O livro é de 2000. De lá pra cá muita água rolou. Muito fim do mundo aconteceu. Ainda estou na Contrarreforma. Leio avidamente. Tentando adivinhar o próximo.

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