sábado, 26 de outubro de 2013

resmungos do velho implicante

Não sou o que se pode chamar engajado em termos de políticas ambientais. Faço a minha parte - o básico: sou contra o desmatamento, a favor da proteção dos lençóis hídricos, separo o lixo orgânico do seco, fecho a torneira enquanto me ensaboo no banho ou escovo os dentes, não deixo luz acesa sem necessidade, escolho eletrodomésticos que consomem menos energia elétrica, etc.

É chato constatar, mas sou do time dos desesperançados com a humanidade consumista e imediatista. Ou seja, acho que as coisas só vão piorar para os nossos filhos, netos, descendência em geral. Vale citar o pensamento de uma amiga também desesperançada: é muita pretensão humana acreditar que temos o poder de destruir o planeta. Nós somos insignificantes perante a Natureza (com Maiúscula) -  que se adapta e mais cedo ou mais tarde nos fará desaparecer para sempre - como a dona-de-casa acaba, por exemplo, com um formigueiro debaixo da pia.

Bem, o pessimismo não é à toa. Hoje, durante as 2 horas que permaneci no clube (frequentado por gente esclarecida, politizada, com acesso à informação, bom poder aquisitivo) onde nado, ocorreram 4 situações críticas:

1.
Na entrada da piscina tem o lava-pés. Vigiado pelo salva-vidas. O lava-pés estava tão cheio que transbordava. E o encanamento continuava jorrando. O salva-vidas nem aí, teclando no celular. Não encontrei o registro para eu mesmo fechá-lo. Então me atrevi: você pode fechar o registro? parece que já encheu faz tempo. Ele me olhou com a pior cara. Puro desdém. Pensei que não tinha entendido. Mudei o enfoque: a água está transbordando. Você pode me dizer onde é o registro? Ele voltou à telinha. Grunhiu algo que eu entendi como: isso é da sua conta, velho chato? quando eu me desocupar eu fecho.


2.
No vestiário dos tenistas tem uns chuveiros bons, ducha forte, água farta. Perfeito para relaxar depois do treino. Eu cheguei, tinha um tenista tomando banho. Urinei, guardei na bolsa os apetrechos da natação, separei o xampu, o sabonete, os cremes, a toalha, tirei e torci a sunga, entrei no box e o tenista continuava no banho. Olhei, sem segundas intenções. O cara estava se alongando. Muito devagar, como deve ser. Só que debaixo do chuveiro. Deixando a água (quente e abundante) correr sobre as costas, os ombros, o corpo. Terminei o banho e o cara alongava os braços e a água ainda corria. Me enxuguei, passei hidratante, desodorante, penteei os cabelos, vesti a roupa, assoei o nariz e o tenista lá, sob a cachoeira particular. Centenas, milhares (?) de litros de água escoando pelo ralo enquanto milhões de seres humanos como ele sobrevivem da água lamacenta de cacimbas ou de esporádicos caminhões-tanque.
 
3.
Há na parte seca do vestiário 2 ventiladores de parede. Para refrescar os  tenistas exaustos e  suarentos enquanto trocam de roupa, depois dos jogo. Os rapazes e senhores chegam, a sós, em duplas ou, mais raramente, em trios - e merecidamente ligam os ventiladores no máximo. Refrescam-se enquanto se despem para o banho, conversam animados sobre a partida, os lances, as raquetes, a mulherada. Nem precisa dizer que depois de tudo, vão embora e deixam os ventiladores ligados, ventilando o vazio - ou os espíritos dos espíritos-de-porco que os utilizaram e não se preocuparam em desligá-los. Aí vou eu, o velho ranzinza, dar descanso às hélices e reduzir o gasto da água das hidrelétricas.

4.
Há no clube uma academia, onde costumo malhar depois do treino. Na academia, outro vestiário. Nele há um mictório coletivo. Antigo, daqueles de concreto azulejado, com um cano cheio de furos despejando gotas de água quando se abre a torneira. O que você faria, leitor consciente do sexo masculino, depois de urinar no mictório meio nojento? Abriria a torneira, o tempo de escorrer o xixi pelo ralo e a fecharia em seguida. Não lá. A torneira fica constantemente aberta, no máximo. Os marombeiros urinam, balançam, guardam, abotoam a braguilha, etc, vão embora e deixam a água correr. Outro dia eu falei com a faxineira. Ela explicou. Ficava constantemente aberto por causa do cheiro forte. Pode? O velho chato (eu) vai lá e fecha. Lembrando-se todas as vezes daquela história piegas do beija-flor que carregava no bico uma gota d'água de cada vez para apagar o incêndio da floresta.

Entendeu agora, leitor?

Mesmo desesperançado eu me esforço. Reclamei por e-mail com a diretoria do clube. Se não tomarem providências, eu mesmo imprimirei daqueles avisos chatos, mas necessários - desligue  / feche a torneira depois de usar / seja consciente -, colarei os avisos nos azulejos diante do mictório, nos mármores próximos às duchas, aos ventiladores - até que a umidade os apague - torcendo, do âmago do ser, para despertar a consciência de ao menos uma dessas criaturas.

É, estou mesmo ficando cada vez mais gagá.


Nenhum comentário: