sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Apreensões de Pollyanna moça

Pollyanna Moça me mostrou a entrevista-enxaqueca publicada no blog de Santiago Nazarian em 16/08. Entrei na revista Offline (de e para autores jovens) onde a conversa foi publicada originalmente. Esquisito tudo, a entrevista, a revista virtual. “Quase assustador”, a Pollyanna anotou em seu diário com capa cor-de-rosa e cadeadinho.

Esquisito categorizar a literatura: literatura feminina, literatura gay, literatura engajada, literatura jovem. É redutor, é arbitrário, serve só para facilitar os estudos acadêmicos. Tudo é literatura, independentemente de quem a produz. Imagine: pintura de mulheres? música de esquerda? dança gay? teatro jovem? A pessoa é que se enquadra em tal ou qual nicho, e não aquilo que cria. Santiago N, apesar do tom pedante, respondeu bem. Esquivou-se de apontar diretamente o equívoco.

Depois perguntas sobre a diferença entre a literatura dos anos 90 e a dos anos 2000. Sobre os críticos que se prendem à literatura “pré-anos 60”, estranhamente denominada “modernismo” (existirão mesmo esses críticos? Modernismo não é anterior aos anos 60?). Sobre a falácia (?) dos críticos em afirmar nada de novo ter sido produzido de lá pra cá.

A intenção talvez fosse arrancar do entrevistado uma fala polêmica. Em seu lugar eu teria dito que um crítico que afirme esse tipo de coisa não deve ser levado a sério. A afirmação reforça o preconceito ao invés de romper com ele. Replica o discurso das gerações atuais de todas as gerações anteriores. Santiago N quase cai na armadilha. Afirma que a mudança ocorrida na literatura após os anos 80 ocorreu pelo estreitamento com a cultura pop, a cultura de massa (não seria anos 60?). Mas conserta quando fala de “universalização fragmentada”, de relativização da cultura de massa.

Existem os novos autores, os autores já passados dos 30, os autores velhos, os autores da terceira, da quarta idade. Não quer dizer que um ou outro produz ou deixa de produzir literatura do seu tempo. Aos cinquenta anos eu não escrevo nada que não seja do meu tempo. Espero ser igual aos cem anos.

Pollyanna Moça anotou no diário (capa cor-de-rosa com cadeadinho): “a arte é atemporal”. A inocentezeinha acredita que os meios, os veículos, a linguagem é que situam a arte no tempo, e não os acadêmicos, a indústria editorial, os raríssimos críticos, remunerados pela última. Santiago N concorda com Pollyanna: “Vivo em nosso tempo, escrevo em nosso tempo, mas não estou preocupado especificamente em falar deste tempo ou negá-lo”.

O resto da entrevista é bobagem. “Jovens talentos”, “jovens talentos universitários” e “jovens talentos blogueiros”, “jovens talentos transgressores” soa com o timbre do preconceito mencionado acima. Bobagem a entrevistadora perguntar se Santiago, autor estabelecido, deveria apontar novos talentos, talentos “potenciais”. Bobagem a resposta de Santiago, dizer que não porque precisa defender o seu gadinho letrado.

E Pollyanna Moça, apreensiva, me obrigou a refletir: seria eu um autor datado? Não seria transgressor, por ter quarenta e oito anos? Por pertencer a uma geração intermediária entre os “pré-anos 60” e pós-anos 80? Estaria fazendo literatura de gênero, literatura gay? Até perdi o sono...

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