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Sexta-feira eu não estou para ninguém. Não atendo telefone, não respondo mensagens, não abro a porta para o carteiro ou para o funcionário da companhia de eletricidade. Não leio o jornal nem assisto televisão. É o dia de aplicar rodelas de pepino nas olheiras, lixar as unhas, escovar a língua, clarear as gengivas com limão e gengibre e aparar o excesso de pêlos do nariz e das sobrancelhas. Preparo salada de pétalas, fatias de carne fria temperada e arroz negro para o jantar. Retiro da cristaleira a louça e as taças que pertenceram à vovó e os talheres de prata comprados na Sears Roebuck. Resfrio o vinho moscatel e pingo uma gota de água de rosas na jarra de água gelada. Para esperar o grande amor que ainda não veio, mas, tenho certeza, tocará a campainha qualquer dia desses.
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Sábado eu acordo cedo. Frustrado por não ter vindo, ontem, o grande amor. A cabeça estourando por causa do vinho doce e dos cigarros fumados depois do jantar. Ávido para colocar a conversa em dia. Telefono para a amiga com nome de flor e para a amiga com nome de erva aromática mas nenhuma atende àquela hora da manhã. Vou ao mercado com chapéu e óculos escuros. Preencho o carrinho com sorvete e bobagenzinhas para passar o tempo. Guardo tudo na geladeira e me espicho na espreguiçadeira, lendo Dostoievski, ouvindo música clássica ou eletroacústica e observando, de rabo-de-olho, a perfeição dos traços do rosto e do corpo torneado e bronzeado do limpador da piscina. Durmo em meio a pesadelos lúbricos e acordo lá pelas 2, morto de fome e com os ombros em carne viva pelo excesso de sol.
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