sábado, 11 de dezembro de 2010

Margareth com "th"


Trabalhar fora? nem pensar. A pele de bebê condenada a murchar no puxado do fundo da oficina.

Margareth. Com "th". Mas preferia Meg. Meg do Zé Borracheiro. Tão delicada. Sorriso de propaganda de creme dental.

Unha vermelha? Escova permanente? Tintura loira? Lingerie branca? Tudo coisa de puta. Não suportava mais ouvir.

Prisioneira do monstro.

Cada noite o bruto morria diferente. Pó de vidro no arroz. Veneno de rato na cerveja. Gilete na carótida. Chumbo derretido no ouvido. Explosão do compressor. Tiro. Incêndio. Homicídio.

No dia seguinte o mesmo café com pão. Arroz, feijão e bife. Sopa de legume, canja. No domingo, macarrão com frango e estupro.

Estupro sim. Es-tu-pro. A manicure horrorizada aumentou o volume do rádio.

Amiga libriana, corte da vida tudo que não te serve mais.

Tirou o dinheiro que pôde. Arrumou a mala. Daquelas vermelhas, antigas, de couro falso e forro de cetim. Duas mudas de roupa. Creme nívea. Estojo de maquiagem. Dentifrício.

Sentadinha no ponto de ônibus nem viu o Zé se aproximar por trás. Só o sopapo. O gosto de sangue. O povo juntando. Dois dentes. Logo os da frente.

O covarde gostou. Repetiu a dose. A sopa insossa. Ou salgada. A batata cortada grande. Cozida demais. Café fervido. Copo mal lavado.

Coitada. Queixar a quem? Proibida de telefonar. De ligar o rádio. Até de fazer as unhas. Delegacia da mulher só em Goiânia.

Nunca mais riu quando a chamavam de Meg. Vergonha dos dentes quebrados.

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