quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

diário de recife - dia/noite 2


Acordei tarde. No café da manhã eu evitei o charque e o escondidinho de carne seca. Fazendo a linha saudável no início - frutas, iogurtes, granola. Em compensação me acabei nos bolos. Depois, enrolação para sair. Lendo, cochilando, jogando conversa fora. O amigo queria ficar por aqui mesmo, nas belas mas tediosas praias da Piedade. Eu o convenci a irmos para o agito de BVG (Boa Viagem, na gíria gls local).

Encontramos de cara uma grande tenda, onde ficamos protegidos do sol, acompanhados somente de um trio - enfermeira, mãe inválida e filho gay. Estreei a sexy-sunga-nova sob a bermuda com estampa neoconcreta. A única caipirinha depois das 12:30 derramou-se na areia. 1 cerveja, abacaxi, troca de olhares oblíquos (de novo a imagem) com um tritão belo e jovem e tão distante como se estivesse do outro lado do oceano.

Decidimos almoçar no Centro. Depois de uma longa e infrutífera caminhada (fotografada pelo celular), acabamos por comer em um fast food afrancesado no shopping da Alfândega. Apesar do  arroz piamontês morno e do molho de tomate invadindo o sabor dos camarões, a fome era tanta que parecia delicioso. Depois café e torta de limão.

A partir de certa hora baixou o psicólogo das multidões anônimas. Primeiro, um avô e seus neto e neta, no café. A menina toda cheia de poses e gestos, como se estivesse sendo educada pela Socyla (?) dos anos 70/80. A perfeita futura-mulher-esposa-exemplar. O garoto, mais novo, visivelmente o xodó do avô, lendo e comentando o livro As aventuras de um banana - uma série que, pelo que entendi, estava incompleta na livraria. Crianças perfeitas. Bonitos, ricos, bem sucedidos em um shopping elegante, fino e elitista. Teve uma hora que o avô deixou os dois sozinhos na mesa do café para tentar encontrar os livros faltantes. Achei estranhíssimo - neura de grandes centros urbanos - se sequestrassem as crianças certamente o avô morreria de desgosto.

Depois, apareceu um cara que sentou-se em uma mesa ao lado do piano e ficou horas conversando com o pianista. Que também conversava, sem interromper a música.

Eu, prestando atenção. Adoro o sotaque pernambucano.

Cena estranha: um senhor, vestido de veludo vermelho com detalhes dourados, atravessa o café. Seguido de duas princesas. Depois do almoço (quase 17h) fomos ao Marco Zero. No caminho, o encontro inusitado, só possível aqui: aquele senhor-príncipe e as duas princesas faziam parte de um dos muitos grupos de pastorinhas, que desfilariam pelas ruas do centro até o Marco Zero, como eventos comemorativos do natal.

Fiquei emocionado (até às lágrimas verdadeiras) com a cena das meninas e adolescentes, vestidas em cores fortes e vibrantes, cantando e dançando pelas ruas, ao entardecer, por entre as fachadas dos casarões do Recife antigo.

Chegarem a uma praça, subiram ao palco cheio de luzes e dançaram sob os holofotes e microfones. Assim tudo perdeu a graça.

Outra emoção: ver de perto o maestro Marlos Nobre e esposa, velhinhos, acompanhando os compassos do canto e dança das pastoras. Não tive coragem de pedir autógrafo. Valeu pela noite. Pena que não levei a máquina fotográfica. e o celular descarregou.

(Entre o almoço e as pastorinhas, a visita ao centro de artesanato no Marco Zero e a vista do monumento de Brennand. Muito belo.

Depois a volta para casa, de ônibus. Circulamos por toda a cidade, sacolejos e engarrafamento. Impressionante ver o bom astral do motorista e cobrador, no caos do trânsito no horário de rush recifense. E a quantidade de garotas de programa - 4 no mesmo ônibus - provavelmente indo para o trabalho. Estranhas relações.

Ao meu lado havia um casal. Uma senhora, aparência de uns 70 anos, colar de contas vermelhas, brincos com pingente também vermelho, uma enorme verruga na bochecha, que lhe dava aparência de bruxa, e um homem, aparentemente bem mais novo - talvez uns 40, 45 anos. Os dois dormiram todo o trajeto. Ela reclinada no ombro dele e ele segurando firme a mão dela.

Paramos no bar em frente ao hotel para tomar uma cerveja para relaxar. Ao lado da nossa mesa havia uma outra, grande, só com homens. Homens maduros, que chegaram em seus carrões, com 2 ou 3 garotos, bonitos, entediados, gostosos e deslocados. Dando o que pensar.

Agora, tentando vencer o sono, escrevendo esse texto e tentando transferir as poucas fotos feitas pelo celular, que nunca carrega.

Teclando mensagens quase telegráficas com saudades deixadas longe.

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