Riccky. Assim mesmo. Com “c” duplo. Foto felina no site. Sunga branca. À beira da piscina. 30 anos.
Conversa comportada no chat. Repleta de carinhas amarelas, smiles, piscadelas e linguinhas de fora.
Ameaçou desconectar quando o assunto descambou para preferências sexuais. O Sedutor obrigado a gastar lábia para contornar a gafe. E manter Riccky conectado. Ao fim da noite dobrou-se-lhe a pudicícia.
Valeu o esforço. Riccky era mais bonito ao vivo. Moreno jambo. Dragão e ideograma chinês nas costas. Corpo, pernas, braços, bunda de modelo de anúncio de perfume.
Sentaram-se no tapete. Cenário armado com todo cuidado pelo Sedutor. Media luz, cool jazz, vinho na despensa, uísque, energético. Riccky preferiu cerveja.
Mas não engrenava. Os vôos erótico-filosóficos out do Sedutor abortados pelo papo in de academia, balada, marca de roupa, aditivos químicos, academia. E cervejas.
Era já ou nunca. Abandonando a filosofia, o Sedutor segurou firme o joelho do prestes-a-ser-seduzido. Que fechou os olhos. Cândido. Virginal. Biquinho esperando o beijo. Caliente, ardente, ofegante, molhado, demorado, descontrolado. Aparando qualquer diversidade cultural.
Depois, sem assunto, assistiram TV. Riccky ia embora. Batente cedo no dia seguinte. 5 minutos após deixar o seduzido à porta do prédio, o Sedutor enviou torpedo. Pedido de namoro.
Por descaso ou inexplicável força oculta do além Riccky respondeu a mensagem 2 dias depois. Com um emoticom enrubescido e encontro agendado para o sábado.
O sábado amanheceu repleto de esperanças. Riccky aceitaria? Passeariam de mãos dadas pelo bar gay? Agarrariam-se na pista de dança da boate? Viajariam de férias para Jeri? Cochilariam recostados um no ombro do outro no avião? Etc.
Riccky nem tocou no assunto da mensagem. Trouxe necessaire, camiseta sobressalente e um beck.
Beberam todo o álcool da casa. Riccky fumou o beck. A certa altura e por força da situação aconteceu o sexo. Sofrível. Um bêbado. O outro doidão. O Sedutor impressionou-se com a eficiência de Riccky. Capaz de beijar e assistir TV ao mesmo tempo. Dormiram abraçados. De conchinha.
Ou, melhor, o Sedutor aconchegou-se a Riccky.
Se fosse a história da Bela Adormecida a noite teria durado cem anos. Ao acordar o Sedutor esfregaria os olhos e se espantaria de como tudo estava diferente à sua volta.
Mas não era. Apesar de pairar algo esquisito no ar.
O Sedutor acordou cedo. Sentou-se na poltrona em frente à cama. Só para olhar Riccky dormir. Cena digna de qual pintura de Hockney? Qual foto de Mapplethorpe? Qual desenho de Wesley Duke Lee?
Finalmente Riccky acordou. De cara feia. Nem uma beijoca. Um bom dia. Um sorriso. Um olhar. Nada. Vestiu a cueca. Mijou de porta aberta. Ligou o computador sem pedir. Entrou no site (o mesmo onde eles se conheceram). Conversou por muito tempo no espaço virtual. Como se o Sedutor, real, não existisse.
Depois Riccky pediu uma toalha. O pedido-fagulha-de-esperança reacendeu a chama-da-esperança do Sedutor. Claro, era só ressaca. Riccky só precisava de banho para recuperar-se. O Sedutor buscou a toalha mais king size, mais felpuda, mais macia, mais cheirosa.
Enquanto Riccky banhava-se, o Sedutor caprichou no café da manhã. Louça nova, talheres, guardanapo. Brunch de primeiro-ministro. De Lady Di.
Riccky sentou-se diante do banquete nem aí. Penteando o cabelo. Despejou o café na xícara. Na toalha branca da vovó. Vasculhou a mesa.
- Tem ovo frito?
Dava até samba, o Sedutor pensou. Enquanto vestia o avental para fritar o ovo de Riccky.
Samba coisa nenhuma. No máximo letra sertaneja.
Inventou uma desculpa. Tipo a mãe morreu agora mesmo em acidente aéreo em Uberlândia. Precisava sair rápido. Colocou Riccky no carro. Junto com a escova de dentes, a bagana. E a promessa de se verem de novo qualquer dia desses.
Um comentário:
Eita, e agora?
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