quarta-feira, 21 de maio de 2014

história de verão insular 3

Era a tua última semana e você já se sentia seguro para voltar para o hotel no último ônibus, o da meia-noite. O ônibus estava cheio e você não contava com isso.

Você estava exausto após 10 horas de caminhadas em lugares e vistas exóticas e exuberantes e alguns gins-tônica durante o jantar. Você estava distraído, isolado pela música alta dos fones de ouvido. Você colocou a mochila no chão, entre as pernas, para não atrapalhar as pessoas.

Você sentiu que alguém parou ao seu lado e segurou a barra de apoio e encostou de leve a mão na tua mão. Você afastou a mão alguns milímetros. O ônibus sacolejou na curva e a mão alheia voltou a encostar na tua. A mão era fina e delicada mas indubitavelmente uma mão de homem.

Você voltou um pouco a cabeça na direção mas não conseguiu ver muita coisa. Você tinha tirado as férias para esquecer o passado amoroso recente e ainda não estava preparado, não estava a fim de aventuras aleatórias. Você retirou a mão da barra e segurou a correia individual que pendia da barra presa ao teto. A mão fina e delicada pegou a correia mais próxima e a fez deslizar até encostar de novo na tua mão.

Você se voltou inteiro para olhar de frente o dono da mão. Deparou-se com o rosto mais lindo e angelical e viril ao mesmo tempo de toda a tua estadia. Cílios longos, sobrancelhas negras e espessas, barba por fazer e uma boquita vermelha capaz de te tirar qualquer um do sério, de arrancar pela raiz a tua intenção das férias interiorizadas e celibatárias.

Você relaxou a postura. Deixou a mão junto da mão fina e delicada. Sentiu o dedo mindinho da mão fina e delicada acariciar delicadamente o teu dedo mindinho carente segurando a correia de apoio do ônibus. Sentiu outra mão roçando muito de leve, quase sem encostar, as tuas costas, naquele lugar sensível à altura da lombar.

Fechou os olhos imaginando um futuro de areias cor-de-rosa, ondas verde-esmeralda e nuvens de algodão flutuando no límpido céu azul-bebê. Nos braços, é óbvio, do dono das mãos ousadas.

Você abriu os olhos pouco antes da parada em frente ao hotel. Você se perguntou: Será que foi um sonho?

Não havia mais mão, nem dono da mão, nem ninguém parecido por perto. Também não havia a mochila entre os seus pés nem o passaporte, o cartão de passe e a carteira com muitos dólares e o bilhete do voo de volta, para dali a 2 dias, no bolso de trás da calça.

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