Vi, no sábado, Praia do Futuro, filme recente de Karim Aïnouz, com Wagner Moura, Clemens Schick e Jesuíta Barbosa.
Junto com o público mal-educado característico de shopping no sábado à noite: barulho de papel amassado dos sacos de pipoca, muita conversa em voz alta, celulares tocando ou piscando ao lado e aquelas ridículas e insuportáveis expressões de surpresa das mocinhas quando apareceu algo tão chocante como bunda de homem ou pior, ostensivamente reprovadoras quando rolou a primeira cena de sexo entre os protagonistas.
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Não entendo essa surpresa das moçoilas. Nem o motivo pelo qual elas têm que a expressar - e expressar seu repúdio de maneira tão veemente. Será que não sabiam a sinopse? Não viram o trailer? Não leram nas redes sociais? Ou será elas imaginarem - nas profundezas de seus inconscientes - se é possuem - e não quererem admitir - os seus próprios namorados nos braços ou sob o charmoso alemão motoqueiro?
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Dizem que o grande público frustra-se ao não rever as proezas metrossexuais do super-herói Capitão Nascimento, personagem que Wagner Moura imortalizou em Tropa de Elite I e II. E se enfurece ao constatar que o estereótipo do soldado machão brasileiro esvazia-se e se contradiz na crise de identidade do quase atormentado e frágil bombeiro salva-vidas gay ao se defrontar (e lutar por) uma paixão por outro homem.
Será?
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As conversas em voz alta e um ou outro "psiu" na plateia prosseguem. Para felicidade daqueles gatos pingados que queriam assistir ao filme, os jovens casais hetero chocados vão saindo da sala ao rolar o beijo (depois da primeira transa) entre os protagonistas. Na 2a. cena de sexo (cru e quase explícito), lá pelo meio do filme, finalmente a sala está quase vazia e silenciosa.
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É um lindo filme. Poético, contundente, essencial. Áspero, intenso, visceral, como disse o jornalista de O Globo. A fotografia é primorosa. A música, perfeita. Os atores de primeira. Ao contrário da maioria dos filmes nacionais, a direção de ator foi bem feita. Roteiro, cortes, ritmo - tudo é impecável.
Longos silêncios, diálogos essenciais, trilha sonora, texto e subtexto perfeitamente encadeados entre palavra, som e imagem.
Daqueles filmes que você sai com a impressão de ter vivido toda uma existência paralela durante as 2 horas da projeção.
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Apesar do diretor propositadamente utilizar-se de vários clichês românticos gays (um melodrama de macho, como afirma o título da matéria na Folha de São Paulo), Praia do Futuro está muito além dessa generalização. Desenrola-se no filme uma grandiosa e ao mesmo tempo ridícula história de amor humano.
A sensação foi a mesma de quando vi pela primeira vez Brokeback Mountain. Com vontade de que não terminasse. Com vontade de ver de novo. Com vontade de que todo mundo visse e se emocionasse e mergulhasse e saísse do cinema transtornado e transformado. Arrebatado.
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Pena as moças e moços mencionados no segundo parágrafo não terem ficado até o fim do filme. Pena não terem se esforçado para entender que o nojo e o horror que faziam tanta questão de expressar era estupidez, ignorância, estreiteza de espírito. Era puro medo de encararem-se a si mesmos no espelho onde perderam a oportunidade vivenciar uma experiência estética para além das conversas bobas, das mensagens vazias do celular, do saco de pipoca e do copo de refrigerante.
2 comentários:
belo texto, Glads.
vou ver o filme nesta semana.
Filme muito bom e excelente seu texto a respeito desse público hipócrita que invade as salas de cinema da nossa Cidade e vêem com nojo cenas na tela e cenas ao vivo.
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