terça-feira, 24 de maio de 2011

Meire

Eu precisava voltar para falar com ela. Pedir desculpas. Falar para ela não se magoar. Impedir um malentendido destruir nossa amizade. Amizade sólida. Construída pedacinho por pedacinho. Eu vinha pensando, eu não devia ter saído sem antes dizer para ela não se preocupar. Eu nunca mais iria procurar o Maurício. Eu não queria mais voltar para ele. Dizer que o apoio dado por ela, os conselhos na época da separação eram dez, cem, mil vezes mais importantes que qualquer tentativa do Maurício me reconquistar. Ele que ficasse com o dinheiro, a casa, os móveis, os gatos, os pássaros, os cavalos, o elefante. Eu falei elefante? E com a prostitutinha platinada. De vinte e poucos. Por isso eu ia pegar o celular. Para falar com ela: Que eu não cairia na armadilha dele. Eu nem estava correndo. 80, 90. Eu ando com o celular dentro da bolsa, e a bolsa sempre no banco do passageiro. Eu não achava o celular, você sabe, bolsa de mulher tem de tudo. Eu sei, é proibido dirigir e falar no celular. Quando eu vi, eu estava em cima. Nem deu para frear. Crash! As pessoas nunca pensam que aquilo pode acontecer com elas. Eu estava com o cinto. Felizmente. O celular foi parar em algum lugar no banco de trás. Depois do barulho da batida, fez um silêncio mortal. Nem parecia que se estava no meio do trânsito. Depois eu abri os olhos. Enxerguei tudo embaçado. As luzes vermelhas do carro do bombeiro, da polícia. Não, eu não senti nada. Nem desmaio, nem vontade de vomitar, dizem que as pessoas sentem vontade de vomitar depois do acidente. A única coisa esquisita era não ouvir as sirenes. Silêncio. Será que a pancada tinha atingido o meu ouvido? Eu me lembro de ter visto primeiro... Claro! O motorista do carro da frente. Não, eu não estava surda, porque ouvi o celular. Era o toque dele. Do Maurício. Depois? Eu devo ter desmaiado. Os bombeiros devem ter me tirado. Eu não me lembro como cheguei aqui. Será que os bombeiros trouxeram o celular? Eu preciso tanto falar com a minha amiga. Para avisar que está tudo bem. Para jurar para ela que eu vou deletar o nome do Maurício dos contatos. Como assim? Aqui não pega celular?

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