Bonecos de Olinda. Foto: Teresa Maia. (Obtida em: http://basilio.fundaj.gov.br) |
Duda da Boneca (foto obtida em: http://informativomipibu.blogspot.com.br) |
Seja em festinha na casa de amigos, seja na balada, seja no pagode, no ensaio da escola de samba, no forró de Campina Grande, na gira de caboclo, no frevo do Galo da Madrugada ou em casa, sozinho - meu repertório limita-se a meia-dúzia de passos duros, partindo do ombro - rigorosamente os mesmos para qualquer ocasião.
Falta coordenação motora. Falta ritmo, molejo, requebro, soltura. Falta tudo. Sabe aqueles bonecos gigantes do carnaval de Olinda? Dançam mil vezes melhor que eu.
Mesmo assim (com o perdão do trocadilho) eu não perco o rebolado. Sempre que posso eu estou lá, com meu desengonço. Se puder, até o dia raiar.
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Nos tempos de balada meu bailado era meio místico, meio orgiástico, meio biodança, meio hospital psiquiátrico. Eu fechava os olhos e me deixava levar pela música, movimentos catárticos, mistura de butoh e dança-de-são-guido. Como se não houvesse (ou tivesse?) mais ninguém na pista. Quando tocava música com aqueles harpejos indianos, aí sim, o bicho pegava!
Não me preocupava o que os outros pensassem. Não tinha expectativa quanto a pegar ou não alguém. Só importava a performance interiorizada. Vantagem: por mais lotada que estivesse a casa, sempre abria-se em torno de mim um espaço circular - as pessoas evitando levarem um safanão, esbarrão ou bofetada provocada pela movimentação desconjuntada dos meus membros superiores.
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Outro dia foi em uma festa. Tinha lá um sujeito pé-de-valsa. Mistura de Carlinhos de Jesus com Antônio Nóbrega. O cabra era tão bom mas tão bom que a fama dele na Paraíba era a de levantar cadáver, só no sapatinho.
O cabra resolveu que era questão de honra me ensinar a dançar forró.
Tinha toda uma técnica. Inclusive com preliminares. Entre uma cerveja e outra eu deveria tomar um copito de cachaça. Mas com método, para não embebedar. Segundo ele, servia para amolecer as juntas. Depois (sob o efeito da pinga e da cerveja) eu fechasse os olhos e deixasse o ronco da sanfona me entrar pelos bofes, o tinir do triângulo na corrente sanguínea, a batida da zabumba chegar no coração. Que eu entregasse a alma ao diabo pois o corpo eu tinha que entregar pra ele.
Beleza, eu entreguei sem ressalvas. Invoquei Terpsicore pra garantir. Meio tonto, nem senti quando o cabra me agarrou pela cintura e me arrastou para o meio do salão. Sussurrando no meu cangote: é só contar 1 e 2 e 1 e 2 e 1 e 2.
Alguém se lembra de ter visto, na infância, na feira, aqueles caras que prendiam uma boneca de pano na cintura e dançavam horrores, criando a ilusão de que a boneca era viva? Pois eu estava me sentindo a própria nega maluca. Só que feita de pau e cimento ao invés de feltro recheado com algodão.
Eu, aplicadíssimo. A primeira, a segunda, a terceira música. Trocando os pés, errando na conta, tropeçando nos próprios pés ou nos do parceiro, pagando mico geral. Na quarta, o cabra arretou-se: caraca, velho, eu desisto. Você nasceu com duas pernas canhotas! E me largou sozinho no salão. A fama do cabra nunca mais foi a mesma...
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Mas mesmo assim eu insisto. Dançar é bom pra caramba! De qualquer jeito. No ritmo ou fora dele, com molejo ou sem, requebrado ou varapau - não importa - vale a intenção. Dançar libera as couraças, a energia ruim acumulada, ativa a kundalini, o erotismo, traz felicidade. Dançar prolonga a vida e suaviza a existência.
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Por falar nisso, sexta-feira eu fui pro samba. Só não sambei até o dia raiar (com os 6 passinhos partindo do ombro) porque minha carona quis ir embora antes das 3 da manhã. Mas isso é assunto para outra postagem.
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