quarta-feira, 12 de setembro de 2012

diário

Acordei com Etta James cantando Stormy Weather morno, baixinho, suave, no meu ouvido. Dobrei os cobertores, bati os travesseiros e abri a janela do quarto para tirar o cheiro de saudade, de sono velho, de ressonar do gato e de mofo das gavetas e dos armários. Alimentei os bichos, molhei os vasos de flores, recolhi as titicas dos pombos, as folhas secas e os tufos de cabelo que a vizinha do apartamento de cima faz questão de jogar na varanda. Depois do banho, preparei iogurte com cereais e passei um café bem forte, para aguentar o batente. Caprichei no gel do cabelo, no perfume amadeirado, combinei a gravata vermelha com aquele terno fashion, de cintura estreita e ombros largos e os óculos escuros que me deixam com cara de Keanu Reeves. Saí para a rua preparado para enfrentar a fome dos mortos-vivos, de olho no meu cérebro-com-sabor-de-tofu; o assédio dos extraterrestres desejando mamar minha energia vital; arquitetando antídotos contra o vírus letal (enxertado em minha corrente sanguínea durante o sono), tentando apagar as minhas lembranças.

Mas o que me aniquilou foi imaginar o que você ainda teria a me dizer, ao ver teu nome encabeçando a lista de e-mails não lidos, piscando na tela do computador do escritório.

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