sexta-feira, 4 de março de 2011

Blue quando tudo está irremediavelmente morto (do Livro dos Cacos)

3. O travesti

Eu estava cansada. O lugar fedia a mofo.
Na carótida. Com a gilete de raspar as pernas. Estrebuchou como um porco.  Depois eu me sentei. Nua. Acendi um cigarro. Os dedos sujos de sangue. Risquei com a lâmina a pele do peito dele. Coração trespassado. As iniciais dos nossos nomes merejando em vermelho. Apaguei o cigarro no umbigo dele. Cheiro de carne queimada.
Lavei as mãos. Retoquei o contorno preto dos olhos. As pálpebras cor-de-pavão. Eu me agachei e urinei. Como uma puta. Poça de sangue e mijo em volta dele. Apaguei a luz. O rádio ligado. Gal.  Cantamos juntas. Ressuscita-me! Tranquei a porta. Desci as escadas. O inferno naquela noite nunca mais.

Nenhum comentário: